Para contar a história de Fernando Centeio, começo na primeira pessoa. Porque foi assim que tudo começou, pelo impacto que aquele tipo sorridente e de uma simpatia desarmante teve em mim.
Tinha acabado de me mudar para um escritório novo, no Alto de São João, e tudo tinha aquele aspecto de centro criativo fervilhante, em que imaginava pessoas extrovertidas e entusiasmadas com as respectivas artes, muito mais do que gente enclausurada em gabinetes, de tom macilento, e olhos postos na hora da saída.
Eu (e reforço, esta incursão na primeira pessoa é mesmo só para contextualizar, já vamos ao que realmente interessa) estava delirante com o meu novo espaço: tinha móveis por montar, outros que eu própria me encarreguei de lixar e pintar, e cada dia era uma festa renovada de prazer de construção e de início. Nunca conseguirei descrever o quanto sou doida por inícios.
Os dias foram passando, as pessoas dos escritórios vizinhos também, e só uma me bateu à porta e abriu, depois do meu assentimento feliz:
– Olá! Então seja muito bem-vinda! O meu nome é Fernando, sou o vizinho ali da Zulfilmes! Qualquer coisa que precise é dizer!
Depois desse dia, repetiram-se outros. Calha que o meu escritório é a caminho das casas de banho – é, como se costuma dizer, local de passagem. Mas calha que, entre aqueles que passam, só ele pára. Só ele passa, acena, abre, espreita e atira um bom dia que sabe a verão mesmo que esteja a chover. Só ele não se ensaia de espalhar alegria e uma energia que, mesmo para quem sabe pouco (ou nada) de energias, é uma espécie de raio de luz que fica, mesmo quando a porta se fecha, e ele se vai.
Acresce que Fernando Centeio é um nome conhecido e reconhecido do cinema português. A porra é que o cinema português teima em ser conhecido por poucos. Mas, ainda assim, ele já fez tantas coisas que podia ter-lhe dado para ser como tantos que se julgam acima dos demais e que, por isso mesmo, jamais se dariam ao trabalho de bater à porta de uma ilustre desconhecida, oferecendo ajuda e boas-vindas.
Este é, para começo de conversa, Fernando Centeio. Nos dias que correm, diria que é um começo de conversa que diz muito.
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